quarta-feira, 1 de junho de 2011

Quincas Berro D’água – O Apaixonante Vagabundo de Jorge Amado por Laura Ammann


Esta adorável novela de Jorge Amado foi publicada pela primeira vez em 1959. Foi traduzida para dezenas de idiomas como o francês, inglês, grego, chinês e finlandês e substanciada no balé, teatro, programa de televisão e, em 2010, no cinema, com direção de Sérgio Machado.

Jorge Amado estava, em 1959, imerso na produção do romance de Vasco Moscoso de Aragão, quando lhe foi pedido que escrevesse um conto para um dos primeiros números da revista Senhor. O autor, relutante, deixou descansar Vasco Moscoso e em uma semana escreveu A Morte e a morte de Quincas Berro D’água.

Com o característico regionalismo das obras amadianas, A Morte e a morte de Quincas Berro D’água narra a trajetória de Joaquim Soares da Cunha, funcionário público que abdica de seu alto posto e família para levar uma vida fácil na Bahia mundana. Passa a estar sempre acompanhado de prostitutas e bebuns. Obtém admiração por parte de seus companheiros de submundo, sendo conhecido como paizinho.

O apelido Quincas berro D’água originou-se de um episódio bastante peculiar, em que o nosso beberrão protagonista é servido de um copo de água, pensando que é cachaça. Daí o grito de desespero. Ocorre então, uma de suas mortes e consequentemente, um funeral. 

Eis que o velório vira festança após algumas horas de choradeira: os colegas de gandaia, acreditando que tudo não passava de uma brincadeira de Quincas, levam o seu corpo para mais uma noitada. Ficam todos a passear Bahia a cima, Bahia abaixo e o livro se torna uma das narrativas mais divertidas do autor.

Já do título se fica conhecendo a pluralidade das mortes de Quincas, e a confusão em torno delas é evidenciada nos primeiros períodos da obra. Até hoje permanece certa confusão em torno da morte de Quincas Berro D’água. Dúvidas por explicar, detalhes absurdos, contradições no depoimento das testemunhas, lacunas diversas. Não há clareza sobre hora, local e frase derradeira.

Os boatos e suposições contribuem para a incerteza dos fatos e tudo isso está a favor da imaginação do leitor. É aí que ele entra na história, se tornando íntimo dos personagens, formulando suas hipóteses e fazendo parte das estapafúrdias ocorrências póstumas do lendário Quincas.

O filme de Sérgio Machado dá mais ênfase à faceta cômica da história, abusando da falta de clareza sobre os acontecimentos. A adaptação do roteiro – de Sérgio Machado também – acrescenta alguns elementos novos ao enredo, não sendo uma adaptação inteiramente fiel da obra, mas transmite a alma do livro. 

A obra cinematográfica trabalhou muito bem a questão da regionalidade e sentimento baiano presente na narrativa literária e entreteve a plateia do início ao fim.

Fazem parte do elenco Paulo José, Marieta Severo e Mariana Ximenes. Paulo, no papel de Quincas, mostra que sabe fazer comédia. Com pouquíssimas falas, ele apresenta uma linguagem corporal hilariantemente convincente, parecendo ser o próprio Quincas retirado do livro. Palmas também aos companheiros de vagabundice Pé-de-vento, interpretado por Luis Miranda, e Pastinha, por Flavio Bauraqui.

O “vagabundo de tantas mortes”, como Zélia Gattai diz, é um personagem apaixonante. Eu acrescentaria que Quincas “são personagens apaixonantes”. Assim como suas mortes diversas, existem diversos Quincas, e cada morte simboliza a decadência de um deles. 

Primeiramente, há a sua morte moral, decretada pela família, quando ocorre a renúncia da vida de prestígio que ele levava anteriormente. Ocorre então, a morte física – ao que tudo indica, pois até isso é dubitável – seguida de cerimônia de velório. Essa é a morte do Quincas subversivo, que não é aceita pelos companheiros. 

E por fim, há a terceira morte de Quincas; a mais poética e excêntrica de todas. Desta dispenso comentários e deixo a curiosidade para quem quiser se aventurar nos bordéis, botecos e terreiros baianos.

Fonte: Site Ateliê Editorial

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