Para a Academia Brasileira de Letras, que hoje elegeu a sucessora de Jorge Amado, se Zélia Gattai não existisse, precisaria ser inventada. Jorge é de longe o escritor de maior visibilidade da história de nossa literatura - o advento de Paulo Coelho pode ser superior no detalhe da venda de livros, mas atua numa faixa específica que não concorre com o autor de "Gabriela".
Quem poderia suceder Jorge Amado com o mesmo peso, o mesmo sentido? Um mix de bons candidatos, de excelentes candidatos, não ocuparia o espaço deixado por ele na Academia e no panorama literário do país.
Zélia não foi inventada, porém. Ela existe, existiu mesmo, como escritora de sucesso, autora de alguns dos melhores momentos de nossa memorialística. Poderia ser candidata antes, mas teria a oposição do próprio Jorge.
Elegendo-a agora, a ABL não abre uma capitania hereditária - como alegaram alguns descontentes com a candidatura de Zélia. Pelo contrário: presta uma grande homenagem ao grande Jorge e traz para o seio acadêmico uma autora que há mais de 30 anos percorre a mesma estrada de todos nós, que escolhemos o ofício incerto e intrigante das letras.
Nisso tudo, o que lamento é que o meu irmão Joel Silveira fica mais uma vez de fora. Joel foi preso comigo diversas vezes, num carnaval dos anos 70 chegou na cadeia e não me viu, chamou o comandante do Quartel e disse: "Vão buscar o Cony! Sem ele, eu me recuso a ficar preso". Me pegaram indo para a praia.
Grande escritor, grandíssimo jornalista, Joel merece entrar para qualquer Academia. Mas foi atropelado pela circunstância de Jorge ter sido quem foi. E Zélia, ser o que é: sem favor algum, uma das escritoras mais queridas do povo brasileiro.
A Folha de São Paulo em 8/12/2001
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