O centenário de Jorge Amado é também a celebração de um feito raro no Brasil e até mesmo em países mais afeitos à leitura: a conjunção entre qualidade literária e sucesso de público.
O mais popular escritor brasileiro completaria cem anos hoje. A data será celebrada com exposições, peças, shows e lançamentos de livros.
Morto há 11 anos, Amado é um dos campeões de vendas da editora Companhia das Letras. Apenas "Capitães da Areia", relançado em 2009, vendeu mais de 640 mil exemplares até agora.
Em sabatina realizada na Folha na semana passada, o escritor Cristovão Tezza disse que Amado foi a maior "referência mundial da literatura brasileira".
Hoje, porém, o autor parece ser um nome menos influente internacionalmente.
Pesquisadores estrangeiros ouvidos pela Folha dizem que Amado continua o símbolo da literatura brasileira no exterior, mas ficou restrito aos círculos acadêmicos e pouco cativa novos leitores e escritores.
Uma pesquisa do programa Conexões Itaú Cultural sobre a presença da literatura brasileira no exterior, realizada com 231 pesquisadores, aponta que Amado é hoje o quarto autor brasileiro mais estudado no mundo.
Os três primeiros são, respectivamente, Machado de Assis, Clarice Lispector e Guimarães Rosa.
"Amado foi um contador de histórias sem par, mas acho que seus textos são muito politicamente incorretos, principalmente por causa da posição da mulher, para ter influência entre os jovens", afirma David Jackson, professor de literatura luso-brasileira em Yale (EUA).
"Hoje, nos EUA, raramente um leitor comum vai às livrarias atrás de um livro dele", diz a tradutora brasileira Marly D´Amaro Tooge.
Ela lançou neste ano o livro "Traduzindo o Brazil - O País Mestiço de Jorge Amado" (ed. Humanitas; R$ 35), sobre a presença do baiano em solo norte-americano.
Em 1962, no auge do sucesso de Amado por lá, "Gabriela, Cravo e Canela" chegou a ficar por quase um ano na lista dos mais vendidos do jornal "The New York Times".
"O livro teve uma grande repercussão por se associar à imagem do Brasil que havia sido criada: a de um país tropical e alegre. O lado social da história passou batido", afirma Tooge.
O primeiro livro de Amado lançado nos EUA foi "Terras do sem Fim", em 1945. Com uma trama mais explicitamente política, foi ignorado pelos leitores. "Ele só teve sucesso por lá quando deixou a militância comunista", diz.
Se atuação política foi um entrave para a difusão dos livros nos EUA, nos países então comunistas Amado teve ótima acolhida.
Na Hungria, conta o professor de literatura Pál Ferenc, o baiano foi abundantemente editado no país depois da Segunda Guerra.
"Hoje temos um florescimento secundário de Amado. Infelizmente, a literatura brasileira, além de Paulo Coelho, não consegue mais aparecer solidamente aqui."
Nos anos 1960 e 1970, o pai de "Gabriela" teve também forte impacto nos países africanos que lutavam pela independência. Já as novas gerações, diz o professor moçambicano Nataniel Ngomane, "pouco sabem de Amado".
"Novos escritores estão mais propensos a beber um Jorge Luis Borges a um Amado. Preocupam-se mais em apurar as suas técnicas de escrita com temas atuais."
Fonte: Site da Folha
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